sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Les Mots Sont Allée

Amigos muito legais - muitas vezes artistas também, de áreas diversas da arte e que sempre me inspiram e me fazem ser um artista e humano cada vez mais rico - têm me manifestado o desejo de conhecer um pouco mais a música de nosso tempo. Por isso, resolvi criar esses pequenos posts indicando coisas que gosto muito de ouvir e que acho que são grandes representantes da música dos séculos XX e XXI. Devo esclarecer que não abordarei somente a música de nosso tempo, mas vou me permitir tocar algumas coisas mais velhas (dos anos de 1940 para frente) pois acho que são registros importantes de uma forma de pensar e ver/ouvir o mundo que anda um tanto afastada das discussões. Não farei comentários profundos, analíticos, acadêmicos ou pedantes (pelo menos espero que assim seja) pois acredito que o que tento fazer aqui é apenas seduzi-los à ouvir as obras e deixá-los com vontade de ouvir cada vez mais e apresentar as músicas de forma detalhada demais pode prejudicar a escuta de cada um já que, provavelmente, guiará tais escutas para a minha forma de ouvir. Mais um detalhe, se não tem um fone de ouvido minimamente aceitável ou um sistema de som razoável tente arrumar um, pois caixinhas de som de computador tem bandas de frequência extremamente limitadas e simplesmente matam a possibilidade de realmente ouvir música. (Coisa bem pior e muito mais entediante do que chupar bala com papel). A música da contemporaneidade tem um apreço muito grande pela manipulação do timbre e do espaço enquanto parâmetros de criação, ou seja, sistemas precários de som e monofônicos são reduções extremas de som que extirpariam fortemente pedaços das obras. Algo como ouvir um concerto por um daqueles telefones de barbante que fazíamos quando eramos crianças.


A peça que escolhi hoje chama-se Les mots sont allés para violoncelo solo de Luciano Berio escrita em 1979. O violoncelista russo Mstislav Rostropovich encomendou um conjunto de peças para violoncelo solo para comemorar os 70 anos do
regente suiço Paul Sacher sugerindo a utilização do hexacorde constituído pelas letras do nome de SACHER (Mib, Lá, dó, Si, Mi, Ré) como tema. Para os que não são do universo musical "partituresco", os nomes das notas em países anglo-saxões equivalem as primeiras letras do alfabeto: A, B, C, D, E, F, G, respectivamente, Lá, Si, Dó, Ré, Mi, Fá, Sol. O s em muitos caso da história foi traduzido em música como Mi bemol e o H como Sí natural, como ocorre nesta música. Esse procedimento de uso de letras como inspiração para melodias é um truque musical muito utilizado durante toda a idade média e costumava-se chamar de "soggetto cavato da vocale", ou seja: sujeito extraído da vogal (com perdão da imprecisão do meu italiano). Sujeito é o nome comum na renascença e barroco dado às melodias principais das obras, o que costumamos chamar por vezes de "tema". Retornando de nossa digressão explicativa, Luciano Berio foi um dos compositores convidados por Rostropovich e criou essa pequena pérola. "Les Mots sont Allés" (o título do youtube está errado) em uma tradução literal seria "As palavras foram" ou "As palavras sumiram", título escolhido como provável metáfora para a transformação gradual que Berio realiza ao longo da peça e que fazem com que a sequência de notas do tema inicial desapareçam. Vale ressaltar o cuidado timbrístico operado por Berio, nota a nota e o jogo de tensão e relaxamento sistemático criado pelo compositor através da manipulação rigorosa de intervalos e ritmos que construirão uma deliciosa viagem auditiva entre esses extremos perceptivos.


Ah! Para quem quiser saber coisas sobre o compositor: Site oficial

A fotinho do Luciano Berio acima foi retirada da web.

Espero que divirtam-se!!!!

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